quarta-feira, 2 de março de 2011

Costumes mineiros em chão genuinamente goiano

Lembrava daquela máxima em que dizia que “recordar é viver”. É certo que conhecendo o chão em que estamos pisando, trilhando a partir do ponto que partimos, teremos plenas condições de dar passos seguros para onde caminhamos. Daremos neste texto relevância a trajetória que percorremos até os dias atuais, considerando que somos o resultado de um processo de construção biológico e sócio-cultural que permitiu constituir a nossa identidade. Bairrista que somos, pretendemos compartilhar um pouco de nossa história, a nosso modo, como nossos pais, mães e avós nos contaram.
De acordo com os fatos e registros, chegamos aqui nas décadas de 1840 e 1850, mas bem antes já vivíamos neste solo e éramos conhecidos como Caiapós, os “peles vermelhas”. A formação e o desenvolvimento da nossa região estão ligados principalmente à chegada de migrantes vindos do triângulo e oeste mineiro. As primeiras famílias, ansiosas por conquistar um novo território partiram principalmente de Patrocínio, Araxá e Patos de Minas. Eram grandes famílias, que chegava a aqueles campos dourados pelo brilho do Sol matinal, as margens do ribeirão Santa Bárbara, na época abrangidas pela comarca de Santa Cruz de Goiás e fizeram surgir sob a fé em Nossa Senhora da Piedade, a Capela dos Correias, Campo Formoso e finalmente Orizona.
Localizado a aproximadamente 130 quilômetros de Goiânia, nosso município possui um pouco mais de 14 mil habitantes, grande parte destes vivendo no meio rural e dependendo diretamente da produção agropecuária familiar. Orizona nasceu e cresceu engrandecida pela grande fé, carisma e generosidade daqueles que viveram no interior mineiro, paulista, nordestino e sulista, preservando traços marcantes daquelas culturas, tais como o sotaque, a mesa farta, a fé cristã, o compadrio, o patriarcalismo e o espírito daqueles que levavam (e ainda levam mesmo nos tempos das redes sociais) uma vida prosaica e amistosa.
Segundo o pesquisador carioca Maurício Barros de Castro e o repórter-fotográfico Gustavo Stephan, autores do livro “Juventudes Rurais: Cultura e Desenvolvimento” (2007), “quando se chega a Orizona, a sensação que dá é que está chegando a um município mineiro, diante a hospitalidade e o sotaque dos moradores”. O batismo local acompanhou a sua vocação agrícola. O termo Orizona é uma justaposição que está relacionada à cultura do arroz. No início do século XX, o município era um grande produtor desse grão. Depois veio o ciclo do café, do feijão, do gado de corte e hoje o município é uma das maiores bacias leiteiras do Estado de Goiás. Toda essa vida econômica sempre esteve ligada à tradição camponesa e religiosa e aos valores deste povo cerradeiro que usa das organizações sociais e comunitárias a força propulsora para o desenvolvimento local.
José Pereira da Costa, um ilustre filho deste chão, narrou em um artigo no ano de 1960 traços desta peculiaridade herdada e conduzida por gerações: “de ano a ano se recebia a visita do padre, havia festas religiosas, batizados que farte e casamentos, por amor dos quais, à noite, gemiam violas com descantes plangentes cada qual dos cantadores a dizer saudades do berço longínquo. Dançava-se o cateretê, ouvia-se o pipocar de foguetes, e tudo acabava bem na paz do Senhor. Costumes de gente boa, afeita ao trabalho cotidiano, educada nos sãos princípios da moral cristã. Costumes mineiros que ainda revivem nos mutirões com o mesmo cateretê à noite, entremeado de danças modernas, que ainda refulgem no estrondear de bombas festivas ao chegar o noivado à sede da fazenda, que ainda transparecem, aqui e ali, na ‘roncice’ dos arcaicos instrumentos de fiar e no trapejar de teares, quiçá semelhantes aos que se viam nos Açores. Roda de Cedro e tear de bálsamo exigiam as matronas que, no lar, fabricavam todo tecido de consumo de casa e mais o óleo de mamona para o candieiro, enquanto, a vibrarem a enxada e o machado para equitarem, viviam a sua vida operosa os homens de têmpera invejável. Carros de boi, de uso medieval, tirados por seis, oito parelhas, único veiculo existente para facilitar as colheitas e também a população prover de sal e de implementos ao trabalho”.
Ainda hoje é possível, durante o pôr-do-sol, no início da noitinha, ver alguém fazendo uma visita para o compadre ou sentado na pracinha para “jogar uma conversa fora” com os amigos. Quando vemos isso acontecer precisamos lembrar todos esses elementos que constituem a nossa goianidade, composta a partir de uma miscigenação de elementos que fazem de nossa gente uma gente diferente, não mais importante que ninguém, mas com o dever de cada vez ser melhor. Portanto, façamos o possível e lutemos a cada momento para o nosso ‘hoje’ seja sempre melhor que o ‘ontem’ e não tão bom quanto o ‘amanhã’. Mas nunca esqueçamos que ao nosso lado existem pessoas que merecem isso tanto quanto nós mesmos. Assim, é nosso dever conjugar esse verbo em todos os tempos e pessoas do singular e principalmente do plural. (Extraído do Blog do Anselmo)

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